A Economia Regenerativa e o papel do Brasil para esse novo paradigma
- Regenera Brasília

- há 1 dia
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A ideia de uma economia que não apenas reduz danos, mas regenera ecossistemas, culturas e estruturas sociais, vem ganhando força nas últimas décadas como resposta ao colapso ambiental global. A chamada Economia Regenerativa nasce da constatação de que modelos tradicionais — extrativistas e baseados em crescimento ilimitado — levaram o planeta à beira do esgotamento.
Diferente da economia verde convencional, que aposta na mitigação e na compensação, a abordagem regenerativa propõe um reposicionamento sistêmico: restaurar florestas, solo, biodiversidade e, ao mesmo tempo, renovar relações humanas, cadeias produtivas e formas de decisão econômica. Seu desenvolvimento histórico se alimenta de diversas fontes — permacultura, agroecologia, economia ecológica, ecopsicologia, tradições indígenas de manejo da terra e pesquisas contemporâneas em sistemas complexos.
Nesse contexto global de transição, o Brasil ocupa posição privilegiada e estratégica. O país concentra cerca de 20% da biodiversidade do planeta, possui a maior floresta tropical do mundo, vastas reservas de água doce, capacidade produtiva agrícola de grande escala e uma matriz energética relativamente limpa, com enorme potencial de expansão em energia solar, eólica e biomassa. Mais do que isso, o Brasil reúne um patrimônio humano e cultural singular: povos indígenas, quilombolas, ribeirinhos e diversas comunidades tradicionais que conservam, há séculos, práticas de manejo sustentável e conhecimentos profundos sobre os ciclos da natureza. Esses saberes, quando integrados à ciência moderna e à inovação tecnológica, formam a base de modelos regenerativos capazes de inspirar o mundo.

Ao mesmo tempo, o país é um laboratório vivo de soluções que já apontam para esse futuro. A agricultura sintrópica, as agroflorestas, a pecuária regenerativa, o turismo de base comunitária, a bioeconomia florestal e iniciativas de finanças de impacto mostram que é possível unir produtividade com restauração ambiental. Em territórios diversos — da Amazônia ao Cerrado, da Caatinga ao litoral — comunidades e empreendedores têm demonstrado que regenerar não é apenas uma alternativa ecológica, mas também uma oportunidade econômica concreta, capaz de gerar renda, emprego e inclusão social.
Nos últimos anos, esse paradigma deixou de ser apenas uma filosofia ambientalista e passou a integrar estratégias nacionais e mecanismos financeiros internacionais, especialmente a partir das conferências do clima da ONU. A virada recente ganhou força com iniciativas como o Tropical Forests Forever Facility (TFFF), lançado durante a COP30 em Belém.

O fundo, idealizado pelo Brasil, representa um dos avanços mais ousados da história da diplomacia ambiental: um mecanismo financeiro que pretende captar até US$ 125 bilhões para pagar países tropicais pela conservação contínua de suas florestas, com parte dos rendimentos destinada diretamente a povos indígenas e comunidades tradicionais. Apenas no primeiro dia, foram formalizados US$ 5,5 bilhões em compromissos, incluindo o aporte inicial brasileiro de US$ 1 bilhão. O TFFF consolida uma mudança radical: transformar florestas em ativos permanentes, cujo valor aumenta quanto mais inteiras elas permanecem.
Esse movimento global se soma a outras iniciativas, como a Brazil Restoration & Bioeconomy Finance Coalition, lançada para mobilizar US$ 10 bilhões até 2030 em restauração ecológica e bioeconomia. A partir desses marcos, a Regeneração deixa de ser apenas uma pauta ambiental para se tornar um projeto econômico robusto — com métricas, governança, investimentos e impacto mensurável.

Esse cenário se conecta de maneira singular à realidade brasileira. Posição estratégica, biodiversidade gigantesca, matriz energética limpa e terras indígenas protegidas fazem do país um protagonista natural. Mas o que mais distingue o Brasil na história da Economia Regenerativa é que já existem atividades de larga escala alinhadas ao paradigma, especialmente na transição energética do Nordeste.
A região se tornou um laboratório vivo de tecnologias limpas e inovação industrial. Os estados nordestinos concentram cerca de 30% de todos os projetos de hidrogênio verde do país, e apenas o Ceará prevê atração de US$ 30 bilhões em investimentos até 2031, com capacidade instalada projetada de 11 GW. No plano nacional, o Programa de Hidrogênio somou mais de R$ 200 bilhões em projetos anunciados, integrando eólica e solar para abastecer plantas de hidrogênio voltadas ao mercado global.

Esse movimento acompanha o rápido crescimento da energia eólica e solar no país, com complexos como o Lagoa dos Ventos, no Piauí, figurando entre os maiores da América Latina. A integração dessas fontes — baratas, limpas e abundantes — permite que dados centers, indústrias verdes e cadeias produtivas regenerativas se instalem em território nacional, inaugurando uma nova fronteira econômica.
A nova economia global e as oportunidades para o Brasil
A transição para uma economia regenerativa cria oportunidades estratégicas em setores-chave:
1. Bioeconomia e produtos da floresta
Óleos, fibras, resinas, alimentos nutracêuticos, cosméticos nativos e uma diversidade crescente de produtos baseados na floresta em pé formam um mercado bilionário.
A Amazônia, o Cerrado e a Mata Atlântica podem se tornar polos de inovação e industrialização de baixo impacto.
2. Finanças de impacto e ativos ambientais
Mercados emergentes incluem:
créditos de carbono,
créditos de biodiversidade,
serviços ecossistêmicos,
fundos regenerativos,
green bonds.
O Brasil já atrai grandes investidores internacionais interessados em modelos de negócios territorializados.

3. Turismo regenerativo
A crescente demanda global por experiências de natureza, cultura e propósito coloca o Brasil como destino estratégico. Chapada dos Veadeiros, Amazônia, Pantanal, Jalapão e litoral brasileiro já despontam como laboratórios de turismo de baixo impacto e alta consciência.
4. Cidades e infraestrutura regenerativa
Arquitetura bioclimática, urbanismo de baixo carbono, renaturalização de rios e reflorestamento urbano tendem a transformar cidades brasileiras em exemplos globais de resiliência.
Desafios a serem superados
No entanto, o Brasil também enfrenta desafios significativos: desmatamento ilegal, conflitos fundiários, desigualdade, baixa integração entre ciência e políticas públicas, e uma economia ainda dependente de modelos extrativistas. Superar esses obstáculos exige visão de longo prazo, alinhamento institucional e investimentos estratégicos.

A Economia Regenerativa, nesse sentido, não aparece apenas como uma proposta ambiental, mas como um caminho integrado para combater a pobreza, fortalecer territórios, aumentar a resiliência climática e posicionar o país como protagonista de uma nova ordem global.
Ao assumir essa direção, o Brasil pode não apenas proteger seus biomas, mas também apresentar ao mundo um modelo de desenvolvimento baseado na cooperação, na abundância ecológica e no equilíbrio entre progresso humano e saúde planetária. Em um momento histórico marcado por incertezas climáticas e sociais, o país tem condições reais de liderar a transição para um novo paradigma econômico — um paradigma em que prosperidade e regeneração caminham juntas e onde a vida, em todas as suas formas, ocupa o centro das decisões.











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